segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

O Romance de Romance – memórias de um livro feminino de bolso - Prefácio

Conheci Romance no pátio de uma usina de reciclagem de lixo. Ele estava descorado, com a capa pela metade e as páginas puídas, grudadas pelo vai e vem da umidade, da chuva, do sol e do vento. Eu não tentei, mas talvez nem fosse mais possível lê-lo. Isso pouco me importava, eu não queria saber das histórias de amor cheias de ilusão e finais felizes, o que eu queria, naquele momento, passados quase cincoenta anos de existência, era a realidade, a vida cotidiana de moças, jovens e senhoras. Vidas vividas, choradas, sorridas, suadas, corridas, cansadas e até às vezes, divertidas das mulheres que tinham por hábito (e talvez até por vício) ler romances de bolso. E isso, cara leitora, isso Romance podia me dar. Escondi-o rapidamente na bolsa e saí apressada da usina de reciclagem sabendo que levava comigo um tesouro. No início, tive que ter paciência e cuidado, pois Romance ainda estava muito abalado com o que vira na usina de reciclagem. Segundo ele, de tudo o que vivenciara desde a gráfica onde nascera, à banca de jornal, à primeira bolsa que frequentara, às idas e vindas do Sebo Doutor Anselmo, entrando e saindo de tantas bolsas femininas, nada se compararia à degradação humana que ele assistira na usina de reciclagem. Mas esta era uma outra história que Romance preferia esquecer, uma história de ausência de princípios, de falta de ética e humanidade, de horror por assim dizer. Romance queria mesmo se recuperar para contar o que ele chamava de “pérolas da humanidade”, ou seja, a vida (e morte) das mulheres que manusearam suas páginas, que suspiraram pela história, que o guardaram e tiraram tantas vezes de suas bolsas, os momentos mágicos nas estantes do Sebo Doutor Anselmo... Romance se considera recuperado e pronto, daqui para frente deixo a ele o papel de narrador desta história, composta de muitas outras histórias. Adriana Dezotti Fernandes Chácara Cavalinho Pucareno. Domingo, 21 de novembro de 2010.

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